Brasil. (Des) Proteção social em tempos de pandemia da Covid-19.

Quem poderá nos socorrer nestes tempos pandêmicos, no Brasil? Quem poderá nos acolher? Quem socorre quem? Quem protege quem? E os desassistidos em condições de vulnerabilidade social, quem protege? 

Por: Alessandra Buarque de Araújo Silva.

A família, a sociedade civil, a igreja, a proteção social de cidadania?  A família adoecida, em luto, despreparada para assumir esse papel? A sociedade civil, que não acolhe, mas, doa o pão e a cesta básica? As instituições religiosas? E o Estado, ausente em seu papel de promoção de bem-estar social?

O que fazer nessa hora chegada? Somos muitos, somos tantos, somos poucos…. nessa árdua tarefa de acolher quando precisa ser acolhido.

A realidade brasileira em tempos de pandemia coloca em xeque nossas certezas e verdades frente a tanto negacionismo e relaxamento das medidas sanitárias, principalmente vindo de quem deveria ser o exemplo para a população: o presidente da República.

A discussão sobre a eficácia da vacina contra a covid-19, vacinar ou não vacinar, qual vacina é melhor que a outra, por exemplo. É plausível essa discussão em pleno século XXI? Ante o número de 487.476 óbitos pela covid-19 (dados de 13.06.21 – Ministério da Saúde), número que deve ser muito maior que isso considerando-se as subnotificações. Temos uma única certeza, hoje: o que importa é a vida.  

A inviolabilidade do direito à vida é garantia constitucional, em seu artigo 5º, mas, mais parece letra morta, no Brasil. 

Nosso povo sofre chorando seus mortos, esperando vacina, em um cenário econômico e social em compasso de destruição, agora reforçado pela pandemia. Sofre a população brasileira de 211,7 milhões de pessoas, sendo 170,7 milhões em idade de trabalhar (com 14 anos ou mais), e 14 milhões sem ocupação.

Somos 40% de brasileiros e brasileiras na informalidade, em sua imensa maioria sem a proteção social básica da previdência social. Esse é o cenário encontrado pelo IBGE, na pesquisa PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, da Covid-19, realizada no ano de 2020.   

11 Alessandra Buarque de Araújo Silva. Graduada em Economia. Especialista em Previdência Social. Mestre em Políticas Sociais e Cidadania. Mobilizadora do Pacto Nacional pela Vida e pelo Brasil, CNLB Regional Nordeste 2. Maceió. Alagoas. 

É o projeto de morte do governo brasileiro, a necropolítica, que define os corpos que vivem e os que podem morrer. Tomamos emprestado o conceito de Mbembe (2018), que propôs a noção de necropolítica para dar conta de definir as formas contemporâneas que subjugam a vida ao poder da morte.

Como falar em proteção social nesse cenário? O pacto social brasileiro, que fez letra de lei garantindo os direitos sociais, na Constituição Federativa de 1988, institui em seu artigo 6º são direitos sociais o direito2 à educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e infância, e assistência aos desamparados. 

O homem é um ser social, agente de transformação da realidade social e sujeito de direitos; portanto, enquanto viventes em um corpo de carne, com necessidades materiais que necessitam de atendimento básico, deve o homem agir para obter a garantia desses direitos. 

Falar em proteção social no Brasil é falar sobre direitos de cidadania. O artigo 194, do pacto social de 1988, garante um sistema de proteção social que abrange as políticas de saúde, previdência e assistência social.

“conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.  

Faz-se necessário, para a compreensão do contexto da proteção social no Brasil, uma leitura mais ampliada de algumas temáticas a partir do conceito de seguridade social: orçamento da seguridade social e fundo público, por exemplo, cujo espaço aqui não é favorável nem indicado para esse aprofundamento, mas que tem a sua relevância e nos leva, nesta perspectiva, a compreender o cenário de retrocesso no campo dos direitos sociais vivida pelo povo brasileiro em tempos de pandemia da Covid-19, sem desmerecer a necessidade de nos aprofundarmos na análise das escolhas insensatas do governo brasileiro em não garantir proteção à vida e o bem-estar de sua população.

Em breve relato, no campo da saúde, o orçamento público para 2021 acompanha os valores previstos para 2019, como se a pandemia não mais existisse no Brasil. O programa de imunização ainda não atingiu os 20% da população brasileira vacinada com as duas doses previstas. Ainda estamos muito longe de atingir o percentual de segurança que possa permitir voltar ao convívio dos nossos e a liberdade de ir e vir sem colocar em risco a nossa vida e das pessoas em nosso entorno. 

Na Assistência Social, o auxílio-emergencial mais parece um auxílio de fome que não ajuda a cobrir as despesas mais básicas, quando, por exemplo, o botijão de gás custa em média R$ 80,00 e, nas grandes cidades, já chega a R$ 100,00. É preciso ressaltar, também, o trabalho dos nossos pares no Congresso Nacional que, em 2020, garantiram o valor de R$ 600,00 para o auxílio-emergencial, contrapondo-se aos desejos do  governo de garantir apenas R$ 200,00 iniciais. E ainda sem fugir do nosso tema, precisamos refletir que os espaços onde acontecem as lutas políticas são de interesse da sociedade e não devem ser configurados em estranheza a nenhum de nós, em particular.

Nesse cenário, é preciso lembrar que a imensa maioria dos 14 milhões de desempregados no Brasil e os invisíveis ao sistema, àqueles em condições de vulnerabilidade social, são os mais afetados pela pandemia e por uma política de governo que desmonta as políticas de atenção básica à sua população.

No campo da Previdência Social, nos atendo à análise da proteção social básica em tempos de pandemia, podemos dizer que os pedidos de benefícios de pensão por morte, em 2021 cresceram 47% no período, com cerca de 225 mil pedidos aguardando análise no INSS, dados de março de 2021.

É preciso dizer, ainda, que no campo dos direitos à proteção social da pensão por morte, as regras de acesso são muito mais restritas em função da reforma da previdência implementada em 2019, já na gestão atual do governo brasileiro. Manter a renda familiar em tempos de pandemia para o sustento básico de suas famílias é um desafio hercúleo dos brasileiros e brasileiras.

A questão econômica caminha junto com a questão social no Brasil pandêmico, destruindo lares, famílias e amores de cada um. A fome e o luto andando de mãos dadas no Brasil da desproteção social como política de governo.

A partir desse relato, que poderá ser aprofundado em outras análises e não tendo a pretensão de esgotar o tema, bem como não se traduzir em verdade absoluta, convidamos todas as pessoas a envidar esforços para agir no campo pessoal, nos mantendo vivos e cuidando de nossa saúde física, mental e espiritual e de nossos amores; e, no âmbito coletivo, atuando como agentes de transformação da realidade em que vivemos, contribuindo para a construção de uma nova ordem social onde caibam todas as pessoas em condições de igualdade de direitos e de vida. 

Referências:

Boletim Estatístico da Previdência Social. www.gov.br. Acesso em 13.06.2021

Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. www.planalto.gov.br Acesso em 13.06.2021

MBEMBE, Achille. Necropolítica. Biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. Arte & Ensaios. Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Escola de Belas Artes da UFRJ. 8ª reimpressão. Impresso em São Paulo. Novembro, 2020.

PNAD COVID 19 IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. www.covid19.ibge.gov.br Acesso em 13.06.2021.

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