As conversas avançaram e os Pankararu, Entre-Serras Pankararu e os Pankaiuká desocuparam duas torres de energia e o Acampamento Itacuruba da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) e um escritório da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), ambos no município de Jatobá, sertão de Pernambuco. A mobilização chegou a reunir 1.100 indígenas durante oito dias.
Por: Renato Santana (CIMI)
De acordo com o coordenador da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), Sarapó Pankararu, nesta terça-feira, 5, o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal mediaram um acordo com as companhias, durante audiência, e no próximo dia 21 de setembro uma reunião entre executivos das empresas de energia e desenvolvimento e os indígenas ocorrerá no município de Serra Talhada, na sede do MPF.
“Nunca a Chesf se propôs a ter uma conversa assim com a gente. Queremos a mitigação, mesmo porque nunca nos consultaram sobre esses empreendimentos dentro de nossas terras. Passam linhões de energia e temos aldeias sem luz. Queremos energia e compensações para as áreas de educação e saúde, que estamos necessitando de melhorias”, explica Sarapó. A decisão pela desocupação foi tomada em assembleia e o saldo do movimento é positivo.
No entanto, a história só começou a ter um desfecho mais favorável aos indígenas quando uma suposta ameaça de incêndio às torres de energia chegou aos ouvidos dos executivos da Chesf. Rapidamente a companhia entrou com uma reintegração de posse. A Justiça Federal de Serra Talhada entendeu que o melhor caminho seria uma conciliação, ante o deferimento do despejo, e convocou as partes para uma audiência pública, ocorrida ontem. A Chesf, então, depois de décadas, decidiu por um caminho alternativo: ceder e negociar com os indígenas afetados por seus empreendimentos.
“Fomos pegos de surpresa pelo oficial de justiça, mesmo sabendo que poderia acontecer. A Justiça Federal pediu uma audiência conosco. O juiz só pediu pra gente não incendiar nada. Nem íamos. Olha, achamos foi é bom porque o que buscamos até agora foi o diálogo. A Chesf foi obrigada a dialogar. Achamos sensata a decisão do juiz”, argumenta o coordenador da Apoinme.
Os indígenas tiveram a oportunidade de expor suas demandas ao juiz. De acordo com representantes da Justiça Federal, a intenção era de fato buscar uma saída conciliatória. “Deixamos claro ao juiz que só sairíamos com um acordo. Nosso povo está animado. O movimento segue pacífico, queremos o diálogo. Não entendemos porque a Chesf quer o caminho difícil. Quem sabe agora “, diz Sarapó.
A mobilização, cada vez mais numerosa, contou com mais de mil indígenas e buscou o diálogo com as empresas diante da construção de estradas na terra indígena, sem a anuência do povo, e por indenização devido a empreendimentos da companhia que cortam as aldeias. “Estamos num impasse, um débito muito grande da Chesf desde os anos 1970. São linhas de eletricidade que rasgam nosso território sem a devida indenização”, explica o cacique de Entre Serras Pankararu, Marcelo Monteiro.
Para o assessor jurídico da Apoinme, Dinamã Tuxá, “é necessário hoje no país se fortalecer esse tipo de movimento de luta pelos direitos originários, pelo respeito ao que pertence aos povos indígenas, porque mostra como as empresas, as empresas privatizadas e todas as relações envolvendo este governo golpista promovem violações contra os indígenas”. O cacique Marcelo Entre Serras Pankararu afirma que ainda se trata de um movimento pacífico, posto que ele só vai acabar com um acordo definitivo com a Chesf, mas que todos estão dispostos a aguentar as consequências na defesa das terras indígenas.
O prédio da Codevasf, última ocupação realizada pelos indígenas, é um antigo escritório, que assim como o Acampamento Itaparica da Chesf está localizado no município de Jatobá. Ambas, Chesf e Codevasf, atuam em conjunto na região. “Há dez anos a Codevasf tem uma obra do programa Água Para Todos na nossa terra, não concluída. Então cansamos de esperar por Chesf, Codevasf”, afirma Sarapó Pankararu. Para ele, a audiência na Justiça Federal foi uma forma da Chesf se pronunciar.