Declaração Universal sobre bioética e Direitos Humanos – Parte 1

Neste momento de grave crise sanitária e ética que atravessa o nosso país, que já levou a óbito mais de 500000 brasileiros e brasileiras, acolho com humildade o convite do Conselho de Leigos para apresentar um artigo sobre a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos muito mais como uma homenagem ao processo de construção da Declaração e pelo resultado firmado na defesa da primazia da vida.  

Por: Sueli Aparecida Bellato

Se de um lado me falta formação em ciências biológicas, de outro o meu posicionamento religioso, a minha qualificação acadêmica e o interesse social pelos Direitos Humanos permiti-me, afirmar a necessidade de que todos os instrumentos elejam a vida de todos os seres, em todas as circunstâncias, como razão de respeito e defesa.

Também pude reconhecer durante a incursão no tema o crescente interesse pela Bioética tanto no meio acadêmico quanto na esfera pública, o que justifica e responsabiliza ainda mais os formadores de opinião perante a população em geral para necessidade de se difundir importantes trabalhos sobre o assunto e estabelecer a conexão entre Bioética e Direitos Humanos na defesa intransigente da vida em sua integralidade, especialmente da vida dos mais vulneráveis. 

Ao médico Van Rens Selaer Botter devemos o emprego pela primeira vez da palavra bioética quando da publicação de seu artigo, em 1970,  Bioethics, the Science of Survival.  A ideia de Botter era a criação de uma nova ciência, de sobrevivência, com a aliança do saber biológico e os valores humanos. No seu entendimento ocorreria a superação da distinção da cultura científica e da cultura clássica, as humanidades, e geraria um vasto campo de aplicação, como uma construção interdisciplinar. Porém isto não ocorreu em razão da visão limitada de muitos autores e praticantes, atinentes às ciências biológicas e sua aplicação na medicina. 

André Hellegers foi, então, quem primeiro utilizou a bioética no sentido mais estrito de sua aplicação, como o é atualmente. A bioética é, assim, lançada no campo de estudo universitário e como movimento social. Ainda que o legado de Botter acabe se restringindo, praticamente, à criação do termo “bioética”, “sua luta por uma abrangência mais globalizante foi importante e teve a sua repercussão no sentido de não reduzir a Bioética ao enfoque médico”.

A bioética trata tantos de problemáticas emergentes como questões persistentes. As primeiras dizem respeito a conflitos éticos decorrentes do avanço da ciência, principalmente no tocante a novos tratamentos e saúde pública em geral. Já as questões persistentes decorrem, grosso modo, da crônica desigualdade e injustiça social no mundo.

A bioética, portanto, buscou aprofundar suas bases conceituais, uma vez que havia a necessidade de adequar seus referenciais à realidade das populações mais pobres e habitantes de nações com elevados índices de exclusão social. Neste sentido, tornou-se indispensável trabalhar com novos enfoques, abordagens e categorias que dessem respostas mais adequadas aos problemas constatados. 

No Brasil o termo Bioética começou a ser utilizado na década de 90 e ganhou grande importância graças a intensa participação e apoio de brasileiros na elaboração da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos da UNESCO. Apesar da Bioética ter tido sua abordagem no Brasil tardiamente, ou seja, somente na década de 90, de lá para cá teve um avanço extraordinário no país.

Em 2005, o Poder Executivo enviou um projeto de lei (Lei nº 6.032/05) com a finalidade de criar o Conselho Nacional da Bioética. No mesmo ano, a UNESCO promoveu diversas discussões a fim de formular a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, no qual o Brasil teve ativa participação na elaboração e aprovação da referida Declaração, que se comprometeu a implantá-la efetivamente em seu território.

Ao professor Volnei Garrafa, professor da UNB e membro da UNESCO, é devido o reconhecimento pela significativa liderança na construção da referida Declaração que teve o texto original restritivo defendido pelos representantes dos países ricos e posteriormente ampliado para incorporar os campos sanitário, social e ambiental, conforme as postulações dos representantes dos países em desenvolvimento. 

É o próprio professor Volnei Garrafa, em apresentação da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, a afirmação que o texto aprovado por unanimidade pelos 191 países participantes da 33ª. Sessão da Conferencia Geral da UNESCO . em 19 de outubro de 2005,  deveu-se ao apoio inestimável de todas as demais delegações latinoamericanas presentes, secundadas pelos países africanos e pela Índia, sendo o teor final da Declaração considerado como uma grande vitória das nações em desenvolvimento.

Desde seu preâmbulo, a DUBDH valoriza a liberdade da ciência e da pesquisa e o bemestar de indivíduos, famílias, grupos ou comunidades e da humanidade como um todo. O texto se fundamenta na observância da dignidade humana, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Nele, há forte apelo à proteção dos mais vulneráveis e ao respeito à autonomia dos indivíduos.

Sueli Aparecida Bellato, religiosa da Congregação de Nossa Senhora – Cônegas de Santo Agostinho  Mestra pelo Programa de Pós Graduação em Direitos Humanos/UNB   

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