O Papa encerrou na noite desta quinta-feira em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, o II encontro mundial dos movimentos populares, reafirmando o seu apoio à luta dos “excluídos”. “A Bíblia lembra-nos que Deus escuta o clamor do seu povo e também eu quero voltar a unir a minha voz à vossa, aos famosos ‘3 T’: terra, teto e trabalho para todos os nossos irmãos e irmãs.
Francisco propôs uma “verdadeira” mudança de sistema, começando por “colocar a economia ao serviço dos povos”.
“Digamos ‘Não’ a uma economia de exclusão e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez de servir. Esta economia mata, esta economia exclui, esta economia destrói a Mãe Terra”, exigiu.
A intervenção condenou a imposição de medidas de austeridade que “apertam o cinto dos trabalhadores e dos pobres”.
“Nenhum poder efetivo ou constituído tem direito de privar os países pobres do pleno exercício da sua soberania”, disse o Papa.
Francisco pediu que “o clamor dos excluídos” seja escutado na América Latina e em toda a terra, deixando de lado um sistema que se tornou global e “e impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza”
Segundo o Papa, o atual sistema econômico mundial “continua a negar a milhares de milhões de irmãos os mais elementares direitos” e “atenta contra o projeto de Jesus”.
“Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável”, advertiu, propondo “respostas globais para os problemas locais”, que superam a “tristeza individualista que escraviza”.
O pontífice argentino advoga mudança positiva, uma “redentora”, que coloque a globalização da esperança no lugar da “globalização da exclusão e da indiferença”.
Francisco deixou votos de que o trabalho conjunto entre governos, movimentos sociais e Igreja possa gerar uma “alternativa humana à globalização exclusiva”, que responda às necessidades reais “dos camponeses e indígenas, dos trabalhadores excluídos e famílias marginalizadas”.
“A nossa fé é revolucionária, porque a nossa fé desafia a tirania do ídolo dinheiro”, indicou.
Nesse contexto, recordou que muitos sacerdotes e agentes pastorais católicos realizam uma tarefa “imensa”, acompanhando e promovendo excluídos em todo o mundo
O discurso falou ainda da tarefa de unir os povos “no caminho da paz e da justiça”, rejeitando o “colonialismo ideológico”.
“Digamos ‘Não’ às velhas e novas formas de colonialismo. Digamos ‘Sim’ ao encontro entre povos e culturas”, destacou Francisco.
O Papa reconheceu, a este respeito, que se cometeram “muitos e graves pecados” contra os povos nativos da América, em nome de Deus.
“Peço humildemente perdão, não só pelas ofensas da própria Igreja, mas também pelos crimes contra os povos nativos durante a chamada conquista da América”, disse, evocando São João Paulo II.
Neste contexto, lembrou os membros da Igreja que, por causa da sua fé, se opuseram a esta lógica da “espada” e lamentou o “genocídio” contra os cristãos do Médio Oriente, nos dias de hoje.
Francisco aludiu também às preocupações que manifestou na sua nova encíclica, ‘Laudato si’, lamentando a sucessão de cimeiras internacionais dedicadas às questões do ambiente “sem qualquer resultado importante”.
“Existe um claro, definitivo e inadiável imperativo ético de atuar que não está a ser cumprido”, lamentou, no discurso mais longo da viagem à América Latina, iniciada este domingo no Equador.
Francisco despediu-se dos participantes com um novo apelo de mudança: “nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhum povo sem soberania, nenhuma pessoa sem dignidade, nenhuma criança sem infância, nenhum jovem sem possibilidades, nenhum idoso sem uma veneranda velhice”.
O primeiro encontro dos movimentos populares decorreu no Vaticano de 27 a 29 de outubro de 2014.