O terceiro dia do Seminário dos Bispos referenciais para o laicato aconteceu na festa de São João Maria Vianey, padroeiro dos párocos, em extensão “dia do presbítero”. Dom Joel Portela, Secretário da CNBB, em sua fala de abertura dos trabalhos do dia destacou os 70 anos da CNBB e os XV anos do Seminário para o Laicato do Brasil afirmando que não haveria Conferência Episcopal se não houvesse os leigos, sem estes, nada acontece na vida da Igreja.
Por: Denilson Mariano da Silva
E também pediu a Deus pelos padres que vivem momentos difíceis, desistindo até da vida. Desculpou-se por não poder estar presente todo o tempo, mas ressaltou a alegria de ver a Igreja “acontecendo”, em meio a tantas iniciativas ocorrendo, simultaneamente, esses dias e a importância de contribuirmos para que a democracia se consolide no Brasil e no mundo. Não podemos aceitar a polarização, ela divide, a diferença enriquece, é preciso viver a diferença na comunhão.
O agir para Encantar a Política
Em seguida, a palavra foi passada ao Pe. Paulo Adolfo, Secretário Executivo do CEFEP, para desenvolver a temática do agir. Ele iniciou a reflexão com uma fundamentação bíblica. Retomou o texto da multiplicação dos pães em que Jesus diz: “Dai-lhes, vós mesmos, de comer!” (Lc 9,13). Diante do povo faminto, Jesus tem compaixão, age como verdadeiro Samaritano. Em outros textos paralelos, aparece André, que apresenta um menino com alguns pães e peixes. Destacou-se que a maturidade da partilha é caminho para superação da fome e para isso Jesus começa por organizar o povo, depois abençoa e promove a partilha: “quando há partilha, não há fome!”
Enfatizou, em seguida, que o Brasil, na atualidade, tem 125 milhões de pessoas na faixa da insegurança alimentar. Isso nos interpela. Produzimos tanto, mas o alimento não chega à mesa do pobre. E ainda há uma “necropolítica” que tenta culpar o pobre por passar a fome. Cristão que acumula e não promove a partilha, não atingiu a maturidade da fé. Temos a necessidade de buscar políticas públicas para que o pão, o trabalho, as oportunidades cheguem a todos. O conferencista retomou afirmações do Papa Bento XVI mostrando que a participação na Eucaristia nos leva a estar a serviço dos irmãos:
“a união com Cristo é, ao mesmo tempo, união com todos os outros aos quais Ele Se entrega. […] A Eucaristia é sacramento de comunhão entre irmãos e irmãs que aceitam reconciliar-se em Cristo, […] A restauração da justiça, a reconciliação e o perdão são, sem dúvida alguma, condições para construir uma verdadeira paz; desta consciência nasce a vontade de transformar também as estruturas injustas, a fim de se restabelecer o respeito da dignidade do homem, criado à imagem e semelhança de Deus; é através da realização concreta desta responsabilidade que a Eucaristia se torna na vida o que significa na celebração […]não é missão própria da Igreja tomar nas suas mãos a batalha política para se realizar a sociedade mais justa possível; todavia, ela não pode nem deve ficar à margem da luta pela justiça. […] quem participa na Eucaristia deve empenhar-se na edificação da paz neste nosso mundo marcado por muitas violências e guerras, e, hoje de modo particular, pelo terrorismo, a corrupção económica e a exploração sexual (Sacramentum Caritatis nº 89).
E complementou com uma citação do Papa Francisco:
“Envolver-se na política é uma obrigação para um cristão. Os cristãos não podem fazer de Pilatos, lavar as mãos. Devemos implicar-nos na política, porque a política é uma das formas mais elevadas da caridade, visto que procura o bem comum. Os leigos cristãos devem trabalhar na política. Dir-me-ão: não é fácil. Mas também não o é tornar-se padre. A política é demasiado suja, mas é suja porque os cristãos não se implicaram com o espírito evangélico. É fácil atirar culpas… mas eu, que faço? Trabalhar para o bem comum é dever de cristão”. (Papa Francisco, em junho de 2013, durante encontro no Vaticano com nove mil crianças e jovens de escolas e movimentos Jesuítas).
Na sequência destacou o que é, e o que não é, o Projeto Encantar a Política. Assim, faz parte do Projeto a política como “Arte do Bem Comum”, como a “forma mais alta da caridade” (cf. Pio XI, Paulo VI, Papa Francisco), algo que vai muito além da questão partidária e do momento eleitoral. Que valoriza a democracia, a cidadania, as instituições democráticas e reconhece o importante papel dos movimentos sociais, das minorias e dos empobrecidos.
Por sua vez, destacou o que não é o Projeto Encantar a Política: como, por exemplo, usar da política em benefício próprio; guiar-se simplesmente por uma ideologia partidária; indicar ou proibir partidos políticos; agir de maneira impositiva, criminalizar os movimentos sociais, ignorar os empobrecidos e as minorias…
Encantar a Política é uma ação evangélica e eficaz na defesa integral da vida, em diálogo e colaboração com a sociedade, de forma propositiva, libertadora, como as propostas da Economia de Francisco e Clara e o Pacto Educativo Global. Por outro lado, é preciso ter cuidado com as armadilhas, com as fake news, com a polarização que nos leva a desviar o foco do Evangelho.
Depois da fundamentação na Bíblia e no Magistério da Igreja, Pe. Paulo Adolfo trabalhou algumas pistas concretas para o Encantar a Política. Enfatizou a necessidade de formação permanente segundo o subsídio publicado pelas Edições CNBB, “Parâmetros básicos para a formação do Laicato” com grupos e escolas de “Fé e Política”, enraizados no Evangelho e na Doutrina Social da Igreja, bem como a busca de fortalecimento da democracia e da participação popular, contribuindo para o fortalecimento das instituições democráticas e a capacitação de lideranças para atuarem nos Conselhos Paritários e de Direito, sinalizando algumas ações a médio e outras a curto prazo. E finalizou citando Dom Helder Câmara: “Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista”. É preciso tornar o Brasil um país onde caibam todos: indígenas, quilombolas, ribeirinhos, negros… um país de todos e para todos.
Não podemos fazer política sem utopia, sem esperança
A maioria das reações foram muito positivas, destacando o encantamento provocado com a fala do secretário executivo do CEFEP. Antônio Félix, essa foi a melhor apresentação do Encantar a Política. Estamos desencantados com a política e com a Igreja, porque somos deixados de lado. Essa reflexão precisa chegar ao “extra-muros” dos nosso grupos; Juliana Santos, é preciso que se leve esse “encantamento” adiante. Por sermos candidatos/as, às vezes somos colocados à margem na Igreja, sem poder, sequer, fazer uma leitura, precisamos gerar iniciativas que ampliem o encantamento com a política; Regina Dantas, foi uma fala que ferveu o meu coração, se juntos somos fortes, unidos venceremos; Odete (CEFEP), há sinais de esperança nesse agir, temos muitos espaços de formação, a Igreja “sou eu”, onde eu estiver promovendo a emancipação do irmão, estou sendo Igreja; Maria Rosa, retomou o lema: construir juntos democratizar a vida! Reforçou a necessidade de uma educação digna no espaço público e a sua importância entre os povos originários e nas periferias.
Retomando a palavra, Pe. Paulo Adofo reforçou a necessidade de se trabalhar a formação e de “furar a bolha”, fazer o encantamento chegar o mais longe possível. O desencanto com a política é uma construção daqueles que estão no governo e que se sentem incomodados com nossa ação que vai recuperando a boa política. Fez menção ao Documento de Santa Fé em que Ronald Reagan, então presidente dos EUA, frente ao avanço da religião comprometida com a vida, cria um plano para combatê-la com outra expressão de religiosa. Necessário se faz redescobrir a força do Evangelho em meio as comunidades a serviço da vida.
Depois seguiu-se a uma partilha de como os grupos, movimentos e entidades estão abraçando o agir a partir do projeto Encantar a Política, citamos apenas alguns: há muitas iniciativas como a produção de vídeos e outros materiais pelos Focolarinos; várias ações na linha de formação presencial e por meio de lives (RCC); a CBJP fez um relato das muitas atividades desenvolvidas, desde a participação em Assembleias, a incidência direta na política em grupos de parlamentares e de assessoria (Fratelli Tutti) cursos diversos, apoio a candidaturas populares e coletivas, entre outros.
Laudelino, coordenador do Seminário, fez um breve comentário sobre as reações no chat e expressou a abertura e disposição ao diálogo aberto e sincero. Os pontos de vista diferentes podem nos fazer crescer, desde que haja abertura de ambos os lados e a capacidade de ver o que ainda não se conseguiu enxergar.
A oração de envio, conduzida por Odete, foi um grito de socorro pela defesa da nossa Casa Comum, por meio de um vídeo com a música: “Salve a Amazônia!” e o refrão que sensibilizou a todos: “Salve a Amazônia! Salve-se a selva, ou não se salva o mundo!” Depois da oração, Dom Geovane, resumiu suas palavras em um grande gesto de gratidão por tudo o que aconteceu neste três dias do XV Seminário para o laicato. E Dom Roberto, viu no encontro uma grande oportunidade para nos encantarmos com a política e que sempre aprende muito com o laicato, ajuda aprofundar o sentido de ser pastor. E finalizou citando Santo Thomas Morus, padroeiro dos políticos católicos, que foi fiel, coerente e manteve o bom humor, mesmo diante de seus carrascos. Por isso não devemos ver os oponentes como inimigos. E não podemos fazer política sem utopia, sem esperança, sem sonhar com um país onde “caibam todos”. Depois fez a oração do Ano Nacional do Laicato e abençoou a todos, dando por encerrado o XV Seminário Nacional do Laicato.